O ritmo e o tempo
As noites e os dias
Um dia, eu falava de Danton
com Wajda. Eu disse a ele ‘parece-me, depois de tantos anos
de trabalho, que uma das coisas mais importantes em um filme é
a alternância de noites e dias’. Não que seja
necessária uma noite para uma noite e um dia para um dia,
pois o dia cinematográfico não tem nada a ver com
a descrição de tudo o que se passa durante 24 horas.
Podemos escrever ‘interior’ do Palácio do Congresso.
‘Dia’ e em seguida ‘interior. Hôtel Arenberg.
Dia’. Será um dia cinematográfico, mas a cena
do hotel poderá se passar três semanas depois. Dentro
de um dia ‘tela’, podemos colocar muitos dias da vida
real, misturar o tempo.
Para as noites, é mais difícil. Temos todos na memória
certos filmes noir americanos que se passam quase que exclusivamente
durante a noite, nos quais uma noite sucede a outra, continuidade
que é mais difícil e acrobática de estabelecer
que a dos dias. Pois sei, sem poder explicar, que uma noite cinematográfica
dificilmente pode conter muitas noites reais. Ao contrário
do que é possível com os dias.
Mas o mais importante é a relação, no interior
de um mesmo roteiro, da sucessão de noites e dias. Isso dá
um ritmo inconsciente que não é percebido, que não
é preciso acentuar, mas que funciona com energia. Esse ritmo
é essencial: todas nossas atividades, nossa vida, são
definidas por ele. Romper com isso condena ao mal-estar, ao fracasso.
Acabo de trabalhar com Daniel Vigne em um filme, Le
Retour de Martin Guerre. A ação se
passa durante três ou quatro meses. É indispensável
estabelecer desde o início o número de noites contidas
em um roteiro. Não podemos escrever um roteiro que dura muitos
meses somente com duas noites. É melhor que sejam 6 ou 7...
sem chegar a abordar as 90 ou 120 que corresponderiam à realidade!
Observei, sem nunca ter tido a teoria, que as passagens do dia e
da noite indicam uma mudança muito rápida. Também
é bom alterná-los de modo regular - se isso é
possível - para que o mesmo intervalo separe as noites umas
das outras. Isso ajuda a encontrar uma respiração,
um ritmo que parece natural porque está de acordo com o desenrolar
do tempo na realidade, com a passagem das estações.
Isso, posso dizer, é quase uma receita.
Quando eu falava para Wajda de tudo isso, ele foi logo interrompendo
e me disse ‘Eu precisei de 20 anos para descobrir isso’.
Esse ritmo é muito importante. Se ele não funciona
ou funciona mal, cria uma espécie de caos que pode ser interessante
se o dominamos, se o organizamos, se brincamos com ele. Um filme
não é um rio que corre com regularidade. Nele podem
existir quedas, cascatas, redemoinhos. Mais uma vez não existe
qualquer regra, mas é preciso saber que, quaisquer que sejam
o estilo e o ritmo de seu filme, esta alternância de dias
e noites é fundamental.
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