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Uma linguagem de olhar e gesto

Fui rever La marche nuptiale, de Eric von Stroheim. É um filme de que gosto muito. Me perguntei como tinha sido escrita no roteiro a cena da sedução a cavalo - ela é bastante conhecida - quando, enquanto uma missa solene está sendo celebrada na catedral, Stroheim, que no filme interpreta um personagem que comanda um esquadrão de cavaleiros austríacos nesta cidade de guarnição, seduz uma jovem que vê passar seu cavalo e seu regimento. Ela está no meio da multidão com seu noivo, um açougueiro muito rude, e seus pais. É uma cena que dura 15 minutos: nem uma palavra é trocada. Não há nada além de olhares, gestos, sorrisos muito discretos.
Como isso foi escrito, narrado, minuciosamente calculado no papel? Tudo acontece no olhar e cada olhar é diferente. Existem os olhares da jovem e ela está com sua cabeça quase na altura do joelho de Stroheim. Ele quer perguntar a ela se ela é casada. Ele está com sua espada na mão, ele a baixa e também os olhos, ele convida seu olhar a fazer o mesmo movimento. Há um contracampo da jovem cujo olhar baixa até a mão de Stroheim, a mão que faz alguns gestos, que a jovem não entende, isso se lê em seus olhos. Então, ele cruza as mãos e em uma outra atitude, um outro movimento, tenta perguntar a ela ‘você é casada?’
É uma cena fantástica, muito erótica. Como traduzir em um roteiro o que não é uma linguagem de diálogo, mas de fisionomia, de atitude? Acho que houve uma decupagem muito precisa, quase desenhada. Não podemos deixar ao acaso da montagem as direções do olhar, os olhos da jovem que vão do rosto até a mão. Isso deve estar rigorosamente previsto.